Ouvi-o hoje duas vezes, uma delas a propósito do concurso de professores: este governo não é pessoa de bem.
Novidade? Nenhuma. Só o registo da tardi-érrima conclusão.
Que este, o anterior governo, quase todos os governos, a bem dizer, não são pessoa de bem e agem de má fé é um dado mais do que adquirido. Que os políticos (quase) todos se estão bem marimbando para outros interesses que não os próprios, quase uma la-palissade. Que o digam os professores, e é só um exemplo.
Pois hoje insurgia-se na rádio (assim a modos que incrédulo - e eu pergunto-me como pode, tanta ingenuidade, tanta cegueira - tanta fita?) - insurgia-se então um qualquer senhor do PSD contra a inconstitucionalidade de se alterarem as regras do jogo a meio do processo (pois, deixa-me rir, que grande novidade ! ou ainda não conhecem o engenheiro??) desta feita a propósito da tributação de mais valias bolsistas. Ah, os 'grandes grupos' não são abrangidos pela manobra, óbvio!- e nada de novo. Apenas mais uma entre milhentas ilegalidades, dispiciendas de tão corriqueiras.
Algum espanto? Nenhum. Só mesmo ouvir Cavaco Silva a exortar à esperança (oh por favor!!) - e no futuro, esclarece ele. Mas qual esperança, qual futuro?
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E o 25 de Abril aí às portas, mais uma vez. As previsíveis comemorações ocas de sentido, e as palavras caindo, quando haviam de queimar. Palavras desvirtuadas, o significante totalmente outro. Palavras conspurcadas por bocas que não deveriam ousá-las.
Ousar .. lutar, ousar vencer, um slogan que de repente me vem à memória como uma frase batida.
Vazia.
E eu que ontem voltei a ver Os Capitães de Abril dessa Maria irmã da Inês, tão alheia uma a tudo o que filmou e o que disse e que pensou a outra. Eu e uma turma de 10.º. Os alunos silenciosos, suspensos da alheia história, daquelas imagens impossíveis, eu falando-lhes em off, contando-lhes de como foi assim mesmo tudo quanto aos dezoito anos vivi senti sonhei.. Eu não me contendo de chorar, cenas que me desfazem, acontece-me sempre que vejo o filme. As lágrimas são as minhas mas o choro não é meu, qualquer coisa assim disse o António Gedeão. Choro por mim e por nós todos que acreditámos. E choro pelo muito, pelo absolutamente tudo que foi desbaratado, por essa esperança morta, pelo futuro desfeito, malsonhado. Choro de raiva impotência saudade e crescem-me ímpetos assassinos. Pudesse - ousasse - eu, e mataria quem matou Abril. Depois penso, para quê? Outros virão e serão iguais, oportunistas, mentirosos, matadores da esperança.
Não há tempo para o sonho, e pelo sonho tenho ido tantas vezes.
Agora não. Agora nada.
E quero esquecer esse mês, e passarei esse dia sem festas e sem emoção, sem canções de luta.
Abril, que seja outro. Um que venha e valha. E pode ser de madrugada.
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