O que há em mim é sobretudo cansaço —
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém, Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço, Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…
E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço…
Álvaro de Campos
F. Pessoa num quadro de Júlio Pomar
2 comentários:
É um cansaço grande, este Dia de Todos os Santos. Chegam ás centenas com uma leveza que não é a nossa, porque só nos familiarizamos com estas entidades trocando: as searas de trigo por um imenso painel de talha dourada. Convertemos o Éden neste lugar contemporâneo.
Esgotados decepamos as flores em virtude de um deserto que nos acolhe, se ali quisessemos ficar PRESOS. É Domingo, o dia faz-nos cansar, deprimir, quase. O corpo das cidades morre em silêncio e renasce logo na segunda-feira. Tavez sejamos os resistentes de uma revolução instaurada pelo SENTIR. O Cansaço já não nos tolhe, o cansaço vira bicho e nos espanta por entre esta partilha sana.
Degusto cada pedaço de si, que fica exposto sob a página do seu blog. ABRAÇO com a exaustão voraz do azul.
Muito oportuno para a época!
Afinal por esta altura comemoram-se aqueles que, cansados, nos abandonaram... ou foram abandonados. Em contrapartida, outros ainda por aí andam mas sou eu que ando cansado deles.
Saudações do Marreta.
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