07 dezembro 2010

os quadros hiperactivos

É.. vou falar de escola e .. ouvide agora senhores .. uma estória de pasmar (lembram-se? Nau Catrineta .. )

Pois foi há sensivelmente dois anos que os vi chegar - profusamente, alegadamente servindo, no início, o projecto da minha escola integrado no Plano Nacional da Matemática.
E vieram e continuaram a vir - e em tão grande número e tão rodeados de pompa e circunstância, que pensei para os meus botões: "melhor será que aprendas a lidar com eles, que qualquer dia tiram-te o quadro branco e as indeléveis canetas e vais-te ver à nora para dares aulas."

Vai daí, inscrevi-me. Primeiro, numa sessão de apresentação dos ditos, que outro mérito não teve senão aumentar a minha tecno-angústia, tão complicado - e fascinante, há que dizê-lo, me pareceu aquilo tudo. Um quadro que se manipula com os dedos, que esconde e desvenda informação ao leve toque de um polegar - um indicador seria mais preciso, mas parece-me ficar aqui melhor o polegar .. adiante. O passo seguinte, e que se impunha, dei-o: inscrevi-me na indispensável acção de formação. Uma daquelas intensivas, 25 horas presenciais mais o respectivo trabalho de casa, tudo a ter lugar naquela altura em que os professores estão supostamente de papo para o ar apanhando um solzinho na Caparica. 

Tenho de confessar que comecei a acção positivamente de rastos, na semana entre a 1ª e a 2ª fase dos exames nacionais. Talvez por isso, ao 2.º dia desisti. É que vocês não imaginam a dificuldade da coisa! Suponho que não para quem tenha vinte anos, o que, refira-se, está longe de ser o meu caso. Além do cansaço inerente ao final do ano, tinha ainda há pouco feito outra acção de vulto - para me actualizar, poder cirandar pelos planos tecnológicos [será que agora também se chamam 'paineis'? - dúvida atroz!! .. vá, deixa-te disso, continua.. ]  Pois dizia eu que estava ainda desgastada por outra acção que fiz, dessa feita sobre utilização da plataforma 'moodle'. Um must, se querem saber. É que não há ADD que a dispense, não sabiam? Pois é, então com o moodle já tinha sido um berbicacho, horas e horas em casa fazendo, desfazendo e refazendo, atrapalhada pela falta de lógica dos termos, as operações impossíveis, os adaptadores de material áudio e vídeo a instalar, enfim. Lá aprendi, continuo a saber trabalhar com ele. Já com os tais 'interactivos'.... népias! É que não há nada, mas nada, que se lhes compare, com a sua infinidade de truques, segredos. Ele é (e estou a ver se me lembro..) bonecada, cortinas de fumo, um nunca acabar de .. interacções, precisamente. Ah, anulei a desistência, esqueci-me de dizer. Porque "és parva, fazes o sacrifício e ficas com os créditos, se precisares ajudo-te", essas coisas .. e lá voltei. E arrependi-me. Aquilo não valia nem o sacrifício nem os créditos, muito menos a sobrecarga de trabalho no fim de um ano lectivo pesadíssimo (obra da sra. mlr, lembram-se?) , dias inteiros de um Julho abrasador encafuada numa sala, suando e suando e suando.

Passo a explicar então o que são os quadros interactivos com que o ministério da educação inundou, se não todas as escolas, pelo menos a minha. (Certo, certo, é que deixei de os ver  por lá .. isto, é claro, é um despropósito ..)  Bom, o meu temor de não conseguir funcionar em aula evaporou-se, pelo menos isso. É que os quadros interactivos (que obviamente entram nas contas dos gastos do Estado com a educação..) são a maior treta de todos os tempos! O exemplo mais acabado do show-off, só comparável, talvez, à invasão dos magalhães. Ou seja, fazes um brilharete de tão tecnologico-proficient, mas o tempo que levaste a preparar o espectáculo deixa-te esgotado e sem margem de manobra para tudo o resto.

Ora então, perguntem-me, para que servem os tais dos quadros interactivos?
Pois .. para fazer bonecadas, basicamente. Enquanto durou a acção, concluí que, a terem algum interesse em sala de aula, só talvez para entreter, motivar se quiserem, os miúdos do 1.º ciclo. Aquilo tem graça? Tem, mas não passa disso. E não julguem que estou a tergiversar (a palavra soou-me bem, fica.. assim, impante de sonoridade :)
Com o meu sentido prático e a mania de que, "já que aqui estou, mais vale fazer alguma coisa que depois possa usar nas aulas", meti-me, sozinha, a fazer um trabalho sobre, vejam bem, aquecimento global! (é um tema que consta do programa de inglês do 11.º ano) - e, briosa como sempre fui, enchi-o de tudo o que lhe desse clareza e a informação necessária às aprendizagens dos meus alunos. Levei .. horas infinitas a trabalhar, em casa, em Julho. Meti gráficos, mapas, vídeos, textos, canções, bonecos e cortinas, o conjunto todo de artefactos disponíveis.
Valeu a pena? Não, não, e não!
Primeiro: se hoje me visse perante um quadro interactivo, desconfio que não saberia sequer por onde começar para o pôr a funcionar.
Segundo: tudo o que me deu uma imensa trabalheira a fazer é facilmente suplantado por outros materiais, que eu sabia já existirem, que tinha, inclusive, usado: tudo está mais claro, mais actual e cientificamente mais credível no site da National Geographic, e é só UM dos imensos recursos disponíveis na internet, prontos a usar, fáceis de manipular e que requerem, apenas, um computador com ligação à www.

Não faço ideia de quanto custaram os quadros interactivos ao país, aos contribuintes como eu, como não faço ideia de quanto custou (e pergunto-me para quê) substituir (ou deixá-los lá, mas imprestáveis por inexistência de paus de giz), os antigos quadros pretos pelos noveis quadros brancos, onde se escreve com canetas tão especiais que não chegam a durar uma semana. Canetas que, e não é preciso ser um génio para percebê-lo, custarão - quê? 10?, 20? 100? vezes mais do que o velhinho, confiável giz. E para quê, repito?

Pois acho que até sei, e a pergunta correcta, no caso de um e outro quadro (o branco, o interactivo), seria, não "para quê", mas "para quem". Há, com certeza, chorudos negócios por detrás desta febre tecnológica imposta por um josé delirante e deslumbrado. Haverá negócios por parte de quem os fabrica e aos seus perecíveis acessórios, por parte de quem os comercializa e por parte de quem depois os 'explica', que o mesmo será dizer, umas acções para professor comer (e é se quer!) e afilhado cozinhar, e bem pago pelo serviço, às vezes de uma qualidade mais que duvidosa. E lá volto eu a enredar-me nas teias das manobras políticas. É que não há volta a dar-lhe! Passou-me a boa disposição com que iniciei o post. Não queria.
Abaixo, mas é, os quadros interactivos!!
QUADRO NEGRO AO PODER!

E .. razão, razão, tem mesmo é a senhora que, lá na escola, não vai em modernices de interacções, lhes adultera o nome sem a sombra de uma cerimónia. Sim,  que o  que eles são, esses caríssimos, super-complicados e imprestáveis quadros, é - in-dis-cu-ti-vel-men-te, hiperactivos! - quase, quase tanto como o seu promotor..
.

2 comentários:

José Couto disse...

A colega tem absoluta razão! Subscrevo na íntegra tudo o que afirma sobre os QI (Quadros Inúteis)...
P.S. Parabéns pelo seu blogue. Continue!

AL disse...

Obrigada, JC!

E aprecio que tenha deixado aqui a sua fotografia: torna claro que a minha perspectiva de 'inutilidade'/ perversidade de algumas novas tecnologias não é, afinal, apanágio -apenas- dos professores mais velhos, alegadamente 'incapazes' de se renovarem e se adaptarem às 'imperativas' exigências dos tempos 'modernos' ..