Salvador Puig Antich [1948-1974] - um jovem catalão anarquista e militante do MIL (Movimiento Ibérico de Liberación) ficará para a História como paradigma da bestialidade humana ao ser barbaramente executado, a 2 de Março de 1974, pelo medieval método do garrote (*) - instrumento de tortura concebido com inimagináveis requintes de sadismo, usado pela Inquisição da Igreja Católica e resgatado para a década de 70 do século vinte pela senha vingativa de Franco, à época o ditador do país vizinho.
A execução de Salvador Puig Antich (lê-se putx antik ) - que, calculo, não terá chegado a ser notícia em Portugal, manchou de horror e incredulidade as primeiras páginas da imprensa por essa Europa fora (ver aqui) e acirrou ainda mais os ânimos contra o regime franquista e a nação que o albergava.
Um mês e 23 dias depois acontecia aqui o 25 de Abril (la revolución de los claveles), cujo desenlace viria a determinar as tensas relações com Espanha, agora o último reduto do fascismo na Península Ibérica. Tensão que, na sequência de novas execuções, desta vez de membros da ETA e da FRAP, atingiria o ponto de conflito máximo no assalto à embaixada espanhola em Lisboa no dia 27 de Setembro de 1975. (**)
Em Portugal vivia-se o rescaldo do 'verão quente de 75', no auge do que era então designado por 'período revolucionário em curso' (PREC) - ver aqui
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(*)
- Salvador Puig Antich foi a última pessoa da história da Espanha a ser executada pelo garrote vil (uma espécie de torniquete colocado no pescoço do condenado, e girado até que seus ossos se partissem ou ele fosse sufocado), método usado desde a “conquista” da América espanhola. O qualificativo “vil” merece destaque: a decapitação era reservada aos nobres, às pessoas mais ricas, aos “homens de bem”; já o garrote era uma forma “vulgar” de execução, aplicada a índios, negros e brancos pobres, geralmente “do campo”. (retirado daqui)
- 24 de Setembro de 1975 – O Governo de Madrid entrega uma nota de protesto formal contra a «ingerência» portuguesa nos assuntos internos da Espanha, devido à cobertura noticiosa da RTP a propósito da condenação à morte de militantes da ETA (Euskadi Ta Askatasuna ) e da FRAP (Frente Revolucionária Antifascista e Patriota).
- 27 de Setembro de 1975 – Comunicado da UDP, distribuído de madrugada e lido aos microfones do Rádio Clube Português, apelando à concentração popular de protesto contra a execução de cinco antifascistas espanhóis, para «que o fascista Franco pague bem caro pelos seus crimes».
- 27 de Setembro de 1975 – Assalto ao consulado e embaixada de Espanha em Lisboa. O consulado na Rua do Salitre é destruído e a embaixada na Praça de Espanha é incendiada, sendo içada uma bandeira da FRAP no mastro da embaixada, numa acção que durou cinco horas. fonte
Sobre Salvador Puig Antich se fez um filme, 'Salvador', cuja banda sonora inclui uma tristíssima canção, I si canto trist, de Luis Llac - um e outra, ao que parece, pouco fieis à essência, quer da luta, quer da personalidade desse guerreiro já comparado ao Che (aqui):
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«Embora seja baseado na história real de Salvador, o filme foi alvo de fortes críticas por parte de antigos militantes do MIL, companheiros de militância de Salvador. Acusam-no de esvaziar de conteúdo político o personagem de Puig Antich e de indevidamente dignificar a imagem pública, quer do seu carcereiro, quer do juiz militar que o condenou e dos membros da Brigada Político-Social da polícia franquista, » fonte
.. em todo o caso, uma lindíssima canção, com uma bela mensagem:
- um excerto da tradução castelhana:
Y si canto triste
es porque no puedo olvidar
la muerte de ignorados compañeros.
Yo no quiero mi canto,
porque sé que han callado
tantas bocas, tantos clamores,
diciendo la verdad;
que yo quiero el canto
de la gente de a pie
con la fuerza de las palabras
arraigadas en la razón.
...
e um filme (duríssimo, ao que me diz quem o viu) que .. esquece Margalida
«(...) Sin embargo, en la película ’Salvador’, nacida con la gran ambición de recuperar la memoria, la memoria de Margalida ha sido substraída. Por supuesto, el ’I si canto trist’, de Lluís Llach, es un hilo musical delicioso, cuya carga reivindicativa trasciende el momento histórico para el que fue escrita, pero no es la canción de Salvador Puig Antich. ¿Lo puedo afirmar con esta rotundidad? ¿Tienen canciones únicas, inequívocas, los mitos? Éste la tiene, se llama ’Margalida’ y ha formado parte de la víctima, del luchador y del mito, desde que el mito se construyó. Su desaparición en la película, es un robo a la memoria sentimental de miles de personas que, con ’Margalida’, aprendimos a amar a Puig Antich. (...) » - Pilar Rahola en 'El País' - 30 de septiembre de 2006 (retirado daqui)
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2 comentários:
Achei divinos seus comentários, aliás amei seu blog. Tb como professora, que sou, compartilho o amor pela justiça, pela leitura e pela vida.
Fabiana Alvarez
Brasil
Olá Fabiana!
Obrigada, fico contente por haver quem me leia, do outro lado do mar!:)
Obrigada pelos elogios, volte sempre!
bjinho,
ana
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