no banco dela e nas árvores
e na areia e na neve
escrevo o teu nome
Em todas as folhas lidas
nas folhas todas em branco
pedra sangue papel cinza
escrevo o teu nome
Nas imagens todas de ouro
e nas armas dos guerreiros
nas coroas dos monarcas
escrevo o teu nome
Nas selvas e nos desertos
nos ninhos e nas giestas
no eco da minha infância
escrevo o teu nome
Nas maravilhas das noites
no pão branco das manhãs
nas estações namoradas
escrevo o teu nome
Nos meus farrapos de azul
no charco sol bolorento
no lago da lua viva
escrevo o teu nome
Nos campos e no horizonte
nas asas dos passarinhos
e no moinho das sombras
escrevo o teu nome
No bafejar das auroras
no oceano dos navios
e na montanha demente
escrevo o teu nome
Na espuma fina das nuvens
no suor do temporal
na chuva espessa apagada
escrevo o teu nome
Nas formas mais cintilantes
nos sinos todos das cores
na verdade do que é físico
escrevo o teu nome
Nos caminhos despertados
nas estradas desdobradas
nas praças que se transbordam
escrevo o teu nome
No candeeiro que se acende
no candeeiro que se apaga
nas minhas casas bem juntas
escrevo o teu nome
No fruto cortado em dois
do meu espelho e do meu quarto
na cama concha vazia
escrevo o teu nome
No meu cão guloso e terno
nas suas orelhas tesas
na sua pata desastrada
escrevo o teu nome
No trampolim desta porta
nos objectos familiares
na onda do lume bento
escrevo o teu nome
Na carne toda rendida
na fronte dos meus amigos
em cada mão que se estende
escrevo o teu nome
Na vidraça das surpresas
nos lábios todos atentos
muito acima do silêncio
escrevo o teu nome
Nos refúgios destruídos
nos meus faróis arruinados
nas paredes do meu tédio
escrevo o teu nome
Na ausência sem desejos
na desnuda solidão
nos degraus mesmos da morte
escrevo o teu nome
Na saúde rediviva
aos riscos desaparecidos
no esperar sem saudade
escrevo o teu nome
Pelo poder duma palavra
recomeço a minha vida
nasci para conhecer-te
nomear-te
liberdade.
[paul eluard, trad. Jorge de Sena]
Paul Éluard (1895 - 1952)
Paul Éluard (1895 - 1952)
Em Janeiro de 1942 o seu poema “Liberté” é lançado por aviões ingleses sobre a França. Milhares de exemplares chegam às mãos da Resistência francesa e fornecem um novo alento na luta pela libertação da ocupação nazi.
1 comentário:
QUEM A TEM...
Não hei-de morrer sem saber
Qual a cor da liberdade.
Eu não posso senão ser
desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei-de morrer sem saber.
Trocaram tudo em maldade,
é quase um crime viver.
Mas embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo
não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.
(Jorge de Sena, Poesia II)
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