in Público, 8/6/11
por Santana Castilho *
'la promesse' , de René Magritte |
“O pássaro cativo vivia na gaiola. O pássaro livre vivia na floresta. Encontraram-se um dia, como estava escrito no destino. O pássaro preso sussurra: “Vem para aqui, vivamos ambos na gaiola!”
Diz o pássaro livre: “Entre as grades, onde há espaço para se abrir as asas?”
“Ah”, diz o pássaro fechado, “eu não saberei poisar no céu!”
O pássaro livre grita: “Meu amor, canta as canções da floresta!”
Diz o pássaro da gaiola: “Senta-te ao pé de mim e ensinar-te-ei a canção dos sábios”.
“Não, oh, não”, exclama o pássaro livre, “as canções não são coisa que se ensine!”
“Pobre de mim”, diz o pássaro preso, “eu não sei as canções da floresta!”
O seu amor é um anseio intenso; mas nunca poderão voar lado a lado. Olham-se através das grades da gaiola e em vão se desejam amar. Agitam as asas, anelantes, e cantam: “Aproxima-te mais, meu amor!”
O pássaro livre grita: “Não posso, tenho medo da tua gaiola fechada!”
O pássaro cativo murmura: “Ai de mim, as minhas asas nada podem, estão mortas.”
O homem e o bando dos seus mais próximos, escorraçados, finalmente, no domingo, deixam-nos um Governo condicionado pela troika. Um Governo engaiolado. Aos que o venham a integrar cabe a missão árdua de nos tirar da gaiola, a tempo de as asas não morrerem.
O estado da Educação daqui a 3 anos é muito mais dependente da qualidade da governação e da sensibilidade à alegoria da gaiola e menos das medidas a que a troika nos obriga. Vejamos, em síntese breve, quais são elas:
- Que é preciso melhorar a qualidade do ensino secundário e profissional, através de um plano de acção a desenvolver. É óbvio e está certo. Muito do actual ensino profissional é um logro, uma mistificação, como quase tudo o que o PS fez. Não se pode fazer ensino profissional de papel e lápis, para reter nas escolas, a qualquer preço, os jovens que, de outro modo, a abandonam.
- Que é preciso melhorar a eficiência do sistema. Óbvio e certo. O que o PS fez foi burocratizar e escravizar os professores, obrigando-os a diplomar a ignorância, reduzindo a eficiência e a eficácia do sistema para níveis pedagogicamente criminosos.
- Que é preciso diminuir o abandono escolar. Óbvio e certo. Mas não se pode fazer isso, como foi escandalosamente feito nos últimos seis anos, sacrificando a posse do conhecimento e varrendo das escolas a autoridade dos professores.
- Que se deve consagrar a autonomia das escolas. Certo. É uma medida que o PS propalou mas não concretizou. Pelo contrário, sujeitou o sistema a um centralismo nunca visto. Os modelos de gestão e de avaliação do desempenho são dois exemplos de castração de autonomia.
- Que se deve reforçar o papel da inspecção do ensino. É corolário do anterior. O Estado deve deixar de interferir mas deve ser o garante da qualidade. Isso faz-se com uma inspecção de carácter científico e pedagógico, que não de índole puramente administrativa. Isso faz-se com uma filosofia formativa, que não punitiva.
E deixo para o fim o mais problemático, a saber:
- Que devemos economizar 195 milhões de euros em 2012 e 175 milhões em 2013, racionalizando a rede de escolas, diminuindo a contratação de recursos humanos e reduzindo as transferências para as escolas privadas com contratos de associação. Compreende-se, no contexto de penúria do país. É desejável? Não. Mas é possível. Há que acabar com gastos improdutivos e escandalosos. Três exemplos: da extinção de todas as direcções regionais de Educação resultariam ganhos de escala e de produtividade (são organismos improdutivos, que servem para complicar e duplicar cadeias de comandos, servindo clientelas); com a reformulação da actuação da Parque Escolar, EP, pararia um delapidar de erário público em obras faraónicas, boa parte delas dispensáveis (esse programa escandaloso já consumiu para cima de 2 mil milhões de euros); com a moralização do programa Novas Oportunidades pôr-se-ia cobro a uma hemorragia financeira sem precedentes (só em publicidade e fantasias similares foram gastos 27 milhões de euros). Seria desejável uma diferente alocação do dinheiro poupado. Mas é possível fazer essa economia, sem perder qualidade.
A premência dos problemas colocados por um sistema de ensino em pré bancarrota supõe que quem chegar ao Governo tenha as soluções pensadas e tecnicamente preparadas. Os limites programáticos que venham a ser estabelecidos devem poder acomodar um quadro dilatado de soluções capazes de conseguir a adesão dos respectivos actores. Os professores assumem papel axial no processo. A consideração das suas motivações e o conhecimento profundo das diferentes ideologias que os lideram são indispensáveis para com eles interagir e com eles não permitir que as asas morram enquanto estivermos presos na gaiola.
Quando choro, por perder o sol, o autor do belo texto acima transcrito recorda-me que as lágrimas podem não deixar-me ver as estrelas. Por isso persisto e não desisto. Por aqui ou por ali, há muito trabalho que tem que ser feito. Para que as asas não morram.
* Professor do ensino superior:
e .. no mesmo post, um comentário que subscrevo:
Junho 08, 2011 1:35 PM
(*) professor e dirigente do PROmova.
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sobre o artigo de Santana Castilho, a análise e os comentários de Octávio Gonçalves (*):Só com Santana Castilho será possível desengaiolar a Educação
Quarta-feira, 8 de Junho de 2011 - aqui
Quarta-feira, 8 de Junho de 2011 - aqui
e .. no mesmo post, um comentário que subscrevo:
E se todos déssemos uma ajuda?
Se houver alguma ideia para alertar Passos Coelho acerca da excelente ideia de colocar Dr. Santana Castilho como ministro da educação, eu assino por baixo.. Ainda vamos a tempo, enquanto estão a decorrer as conversações, antes que seja escolhido outro(a).
Abaixo assinado, e-mail para Passos Coelho...podemos sempre tentar.
Junho 08, 2011 1:35 PM
(*) professor e dirigente do PROmova.
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