Fazer um post sobre Omar Khayyam é tarefa para muitas horas, de que não disponho agora. Acontece apetecer-me a poesia, necessitá-la hoje como um ar que se sorve, uma onda que me leve, lave. Chega de política e da sua feiura. Anseio pelo dia em que consiga passar-lhe completamente ao lado, felizmente ignorante-íssima dos seus sujos meandros.
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Khayyam, então: o enigma, o fascínio em volta, começa logo pelo nome, cuja grafia vai divergindo de fonte para fonte, às vezes dentro do mesmo documento:
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Khayyam, então: o enigma, o fascínio em volta, começa logo pelo nome, cuja grafia vai divergindo de fonte para fonte, às vezes dentro do mesmo documento:
Khayyám, Khayyam, Khayyan, Khayam
Omar Khayyām (1048-1131) foi um poeta, filósofo, matemático e astrónomo da Pérsia (agora Irão). O seu nome completo era Ghiyath al-Din Abu'l-Fath Umar ibn Ibrahim Al-Nishapuri al-Khayyami (em persa: غیاث الدین ابو الفتح عمر بن ابراهیم خیام نیشاپوری).
Khayyām calculou como corrigir o calendário persa, contribuiu em álgebra com o método para resolver equações cúbicas pela intersecção de uma parábola com um círculo, que viria a ser retomada séculos depois por Descartes.
Como poeta é conhecido pelos Rubaiyat - que se calcula rondarem os dois mil - e que ficariam famosos no Ocidente a partir da tradução de Edward Fitzgerald, em 1839. - fonte
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mausoléu de Omar Khayyam em Nishapur |
Para Khayyam o que existe é o momento presente, o seu ensinamento um carpe diem incontornável - o paraíso, o aqui e agora: o amor, as belas mulheres, e o vinho. O vinho, rubro como os lábios de uma mulher, uma fuga de si, um escapar à consciência do vazio. Tudo é nada: a ciência dos homens, a palavra dos sábios e dos astros.. Sofrimento, desilusão, sombras, morte. Esgotar a taça do prazer, a única, tangível opção: quando bebo, ouço o que me dizem as rosas, as tulipas, os jasmins...
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«Puesto que ignoras lo que te reserva el mañana,
procura ser dichoso hoy. Toma un jarro de vino,
ven a sentarte al claro de la luna y bebe
pensando que talvez manãna ella te busque en vano.»
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- de Alfredo Braga, que o estudou e traduziu, toda a informação que segue e a tradução de alguns dos Rubaiyat em http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/rubayat.html
- Khayyam significa, em persa, fabricante de tendas; Omar adoptou esse nome em memória do pai, que era fabricante de tendas.
- Rubaiyat é o plural da palavra persa rubai, e quer dizer quadras, quartetos. No rubai, o primeiro, o segundo e o quarto versos são rimados, o terceiro é branco.
(...) Se formos ler os Rubaiyat, em qualquer tradução, encontraremos, além de Jorge Luís Borges, Pessoa, ou Whitmam, que não o traduziram, mas que o conheciam. (...)
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Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Circunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.
Odes De Ricardo Reis
OS RUBAYAT
de Omar Khayyan
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Nunca murmurei uma prece,
nem escondi os meus pecados.
Ignoro se existe uma Justiça, ou Misericórdia;
mas não desespero: sou um homem sincero.
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Além da Terra, pelo Infinito,
procurei, em vão, o Céu e o Inferno.
Depois uma voz me disse:
Céu e Inferno estão em ti.
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Não vamos falar agora, dá-me vinho. Nesta noite
a tua boca é a mais linda rosa, e me basta.
Dá-me vinho, e que seja vermelho como os teus lábios;
o meu remorso será leve como os teus cabelos.
O vasto mundo: um grão de areia no espaço.
A ciência dos homens: palavras. Os povos,
os animais, as flores dos sete climas: sombras.
O profundo resultado da tua meditação: nada.
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Há tanto tempo giram os astros no espaço;
há tanto tempo se revezam os dias e as noites.
Anda de leve na terra, talvez aonde vais pisar
ainda estejam os olhos meigos de um adolescente.
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O bem e o mal se entrelaçam no mundo.
Não agradeças ao Céu
pela sorte que te coube, nem o acuses:
Ele é indiferente.
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Se em teu coração cultivaste a rosa do amor,
quer tenhas procurado ouvir a voz de Deus,
ou esgotado a taça do prazer,
a tua vida não foi em vão.
Alguns amigos me dizem: Não bebas mais Khayyam.
Respondo: Quando bebo, ouço o que me dizem
as rosas, as tulipas, os jasmins;
ouço até o que não me diz a minha amada.
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O amor que não consome, não é amor;
a brasa tem o mesmo calor de uma fogueira?
Aquele que ama, pelas noites e dias,
vai se consumindo no prazer e na dor.
Cansado de perguntar aos sábios, perguntei à taça:
Para onde irei depois da morte?
Ela me respondeu baixinho: Bebe em minha boca,
bebe longamente: não voltarás
*
O que farei hoje? Ir à taverna? Ler um livro?
Um pássaro passa. Aonde irá? Já não o vejo.
Embriaguez de uma ave no céu azul e morno;
melancolia de um homem que ainda se lembra.
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Senta-te e bebe, felicidade que Mahmud não teve.
Escuta os sussuros dos amantes, são os Salmos de Davi.
Não te importes com o passado, não sondes o futuro,
não percas este instante: Eis a paz.© 2003 — Omar Khayyan
Versão em português
© 2003 Alfredo Braga
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3 comentários:
Não se pode apagar a luz.
Não há escuridão possível.
Não se pode fugir.
Não há lugar possivel.
Não se pode passar ao lado.
Não há lado possível.
Não se pose ser apolítico.
Não há política possível.
Não se pode ser alienado.
Não há alienação possível.
Não se pode fingir.
Não há fingimento possível.
Pode-se ser mais feliz?
Pode.
Se fores @ mais burr@ possúivel...
Não se pode apagar a luz.
Não há escuridão possível.
Não se pode fugir.
Não há lugar possivel.
Não se pode passar ao lado.
Não há lado possível.
Não se pode ser apolítico.
Não há política possível.
Não se pode ser alienado.
Não há alienação possível.
Não se pode fingir.
Não há fingimento possível.
Pode-se ser mais feliz?
Pode.
Se fores @ mais burr@ possível...
Um "bom" selvagem possível...
Não há existência
sem um tempo concrecto.
Não há existência
sem um espaço concrecto.
Não há existência
sem uma pátria concrecta.
Não há vida
com um Sócrates e/ou uma AD concretas...
Que faire?
Um Sartre português angustiado
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