03 dezembro 2009

Na estação

Hoje, nos 14 minutos em que estive à espera do comboio aconteceu-me algo que me fez ver a vida de outro prisma. Aliado a acontecimentos recentes da minha vida, verifico que a vida de uma pessoa pode mesmo mudar com pequenos gestos... Hoje acho que vi, realmente, o que é querer viver e nunca perder a vontade de lutar por uma vida melhor. O que se passou foi comovente e passou-se num tempo pequeno, 14 minutos apenas.
Estava eu à espera do comboio que me leva todos os dias a Benfica, sentado em Sete Rios, quando um homem com uma canadiana se senta ao pé de mim. A conversa foi instantânea. Falámos sobre o atraso do comboio, o homem falava sobre o fumo dos cigarros que o incomodava, eu disse que também me incomodava um bocadinho, mas que toda a vida convivi com fumadores e que não me incomodava muito (o homem tresandava a tabaco, refira-se), falámos sobre o ambiente e sobre o mal que os Homens fazem. Ele disse-me que se tinha divorciado e que tinha duas filhas, já adultas, que o visitavam de vez em quando. Um homem, limpo, que cheirava a tabaco, que vestia uma camisola bonita. O comboio chegou. Entrámos, ele na porta da ponta, desejando-me felicidades e eu retribuindo. Não soube o nome do homem e ele não soube o meu. Começo a ouvir a sua voz, mas com o barulho do comboio não percebo bem o que ele está a dizer. Aproxima-se e percebo o que ele estava a dizer. Chocou-me e abalou-me. "Por favor, uma ajudinha que não tenho as duas pernas". Duas vezes. Três vezes. Quatro vezes. Até que passou por mim. Levei a mão à minha bolsa para tirar umas moedas para dar ao homem, quando ele me põe a mão no ombro e diz que não quer. "Não, hoje deste-me amizade... Isso é mais importante". E continuou para a outra carruagem. Percebi o que dizia o homem. Compreendi-o. Tratei-o como igual e conversámos. O homem não quis o meu dinheiro porque isso mancharia a nossa pequena e recente amizade. Percebi o que é querer viver. Percebi que é pôr algumas coisas acima de nós, coisas tão grandes e tão bonitas como simples 14 minutos de conversa. Todos nós sabemos o que é este simples cliché. Mas experimentá-lo... Mudou-me.

1 comentário:

Margarida Alegria disse...

Lindo!
E contaste-o tão bem que estou sem palavras.Uma crónica e tanto!
Aconteceu-me, há uns anos um episódio um pouco semelhante.Muitas vezes é mais importante uma palavra, um olhar nos olhos como igual, um pouco de tempo repartido.Vivemos por vezes tão embrenhados em nós mesmos que nem sempre valorizamos isso.
Por o teres narrado de forma tão bela e ajustada e por seres uma tão luminosa pessoa, um abraço amigo!
Margarida